domingo, 26 de agosto de 2012

Cuidado

Por Willian Fonseca

    Enquanto caio para o mergulho final, relembro os últimos passos que antecederam a minha morte. Estava com as minhas queridas filhas e minha esposa, me despedindo para uma habitual caçada. Saí só, e durante uma leve garoa, que apesar de fraca, bloqueava parte da minha visão. É assim que tudo começou, marcando o fim da minha pequena aventura chamada de vida.
    O curioso é que sempre fui alertado pelo meu falecido pai sobre sair para caçar só e na chuva, mas nunca dei atenção. Uma vez, num encontro com um grande lobo, um garoto num corcel branco havia me salvado. Foi em um dia de chuva e estava só. Nunca dei atenção ao meu pai.
    Durante o percurso, próximo do local onde a caçada teria início, me distrai com um animal monstruoso, e por medo, corri o máximo que pude. Nas horas de medo, por mais sensato que o cara seja, ele age por instinto, ignorando tudo o que anos de experiência o ensinou. Foi o que aconteceu comigo, pois mesmo conhecendo a mata como a minha mão, me perdi.
    Corri durante horas, mas o demônio era incansável. Sem mais alternativas, desisti e me virei para enfrenta-lo. ao encarar o monstruoso ser, notei que se tratava de um equino, mas não como qualquer outro, pois no lugar de sua cabeça haviam labaredas que jorravam de seu pescoço como o sangue de um porco num matadouro. Ao presenciar tal afronta a ordem natural de Deus, caí. Meu facão escorregou entre os dedos e fechei meus olhos, a espera do fim. "Ao menos vou trocar uma ideia com Tomé, dizendo o que vi", pensei. Mas como a rapadura desaparece após entrar no meu campo de visão, o medonho ser havia desaparecido.
    Seria a minha vitória contra a querida morte, se eu não estivesse na beira do rio.
    Ao me refrescar um pouco com a límpida água que se encontrava a minha frente, escutei o mais belo canto que qualquer homem nesta misteriosa Terra ouviu e ouvirá, e, ao levantar minha fronte, me deparo com a senhorita mais linda que já vi. Seu corpo era dourado, voluptuoso e totalmente exposto ao Sol, e seus longos cabelos negros e cintilantes estavam numa gentil valsa com a brisa leve. Notei algo nas pernas dela como se fossem escamas, mas o intenso brilho e a grande distância me impediu de atestar.
    E assim teve inicio o grandioso momento mundialmente conhecido como o "Eu te avisei". 
    Mesmo com os avisos do meu pai, sucumbi ao encanto dos gentis e sensuais acenos dela. Ignorando o místico peso que meu corpo adquiriu após observar a moça, me joguei na água, com o intuito de alcançar o rochedo onde minha Afrodite estava, porém, em vão.
    Agora, antes da água dominar meu pulmão, no fundo do rio maldito, escuto a risada demoníaca que me impede de ouvir minhas ultimas palavras.
    "Iara".

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